TEATRO PARA DANÇAR

sexta-feira, 25 de julho de 2014

Creche na Coxia, mostra linguagem requintada no palco.

Valeu a pena esperar 6 meses até a estréia, ontem, dia 25 de Julho de 2014, do espetáculo "Ilíada",
adaptado por Silvana Lima, dramaturga renomada, que demonstrou ser ótima adaptadora. Na verdade, ela recriou Homero, dentro de sua própria linguagem, trazendo a fúria grega, para o quintal de Cabo Frio. Uma proeza artística que a muito tempo não víamos. Na saída do teatro, deu para ver as pessoas desnorteadas; um misto de deslumbramento e orgulho. Não foram poucos os expectadores que pronunciaram a frase: "Eles são minhoca da terra!", ou seja, artistas e artífices cabofrienses, mostrando seu trabalho in loco.
Não bastasse a riquíssima montagem com um ótimo retorno de público, o grupo deu um show de produção, ao mostrar um espetáculo com nível profissional que transcende nossas "fronteiras" e no final, a platéia ficou encantada, ao ouvir, nos bastidores, a vibração do elenco. Os gritos de felicidade, depois de uma gloriosa função. Sentiu-se claramente o quanto o grupo é unido e como a mensagem do teatro como um fato coletivo, estava ali, estampado na energia que emanou dos bastidores, pós espetáculo. Foi por isso e muito mais, que o público saudou o Creche na Coxia, aplaudindo-o de pé.
O espetáculo "Ilíada" é completo. Mostra um elenco afinado em todos os sentidos, um cenário multifuncional que permite uma gama de visualizações que culmina na figura lendária do Cavalo de Tróia. O uso de um andaime obriga o ator a sair da zona de conforto. É preciso ter disposição física, equilíbrio na respiração para dosar bem a emissão da voz, já que o espetáculo exige preparo físico, acima de tudo. Pendurado no andaime, um imenso tecido branco, ajudou na construção de imagens dinâmicas que trouxeram grande eficiência para a cena. 
Não foram poucos os momentos em que o corpo foi tão importante quanto a palavra, diga-se de passagem, o grupo agora, defende a tese do teatro físico, colocando em cena o ator numa perspectiva mais narrativa, menos clássico. Isso permite uma versatilidade de linguagem e uma utilização mais arrojada de todo o repertório de cada um. A expansão desse repertório, ficou claro, no desempenho do ator Rodrigo Rodrigues, que foi muito bem explorado em sua potencialidade,pela diretora, Silvana Lima. Rodrigo manteve seu histrionismo de cabaré, quando necessário, e saltou para áreas desconhecidas de sua forma de atuar. Demonstrou domínio do canto na composição do personagem Príamo, pai de Heitor, de forma totalmente convincente.

Teatro lotado numa noite nublada. Só uma coisa motivou o cabofriense a sair de casa; o orgulho de ter um grupo
de teatro bem profissional. O grupo Creche na Coxia...
Outra coisa que chamou muito a atenção, foi o revesamento do violão na mão de diversos atores do elenco, mostrando que o grupo construiu em toda a extensão, sua própria substância criativa. Aproveitou o talento de cada artista e utilizou-o bem, para cumprir todas as etapas do espetáculo. Ivan Alves, por exemplo, além de atuar, fez a construção das máscaras e adereços. Cada uma das peças, se encaixaram bem no contexto proposto pela concepção de cada cena. O figurino, o famoso "básico" adereçado ricamente, explorou formas diversas, além de ajustar-se bem a cada adereço.  Isso fez o espetáculo ganhar uma cara versátil que contribuiu para um visual artístico confortável aos olhos do público.
A Atriz Débora Diniz encontrou sua veia cômica e no momento necessário, arrancou emoção da paltéia, Marcelas Rimes, cresceu muito e seu desempenho e versatilidade encantou. Pedro Brandof, com seu talento circense, trouxe vigor às cenas físicas e Ravi Arrabal, esbanjou versatilidade. A atriz Julia Lima encantou com sua entrada em cena, batendo o tambor e puxando o canto de entrada, ela parece estar em completo transe, mergulhada profundamente na sua técnica de atuar. A atriz Vivi Medina, estava muito a vontade e soube tirar partido de sua presença em cena. Seu detalhismo e perfeccionismo na costura de cada personagem, mostrou sua rica performance, do começo ao fim do espetáculo. 
No conjunto, a musicalidade levou o grupo a um patamar elevado; vozes bem afinadas, tanto no solo como em coro. Isso tornou o espetáculo agradável, cheio de deleite para o público, que aplaudiu várias vezes em cena aberta. Não posso deixar de destacar aqui a cena das máscaras, impressionante o desfile pelo palco, exibindo um teatro com gestos minimalistas, bem desenhados, quase pantomimos, destacando uma pincelada a mais, no conjunto de elementos usados pela concepção e direção. Ilíada já marca como um grande momento da retomada do teatro em Cabo Frio.


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