O Fesq, de 2014, seguiu a linha dos anteriores e já deixou saudades, os trabalhos apresentados por atores de diversas regiões do Brasil, participaram dos debates, uma roda muito divertida e de grande aprendizado pra todos. Segue um comentário breve sobre cada trabalho...
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Artistas de todo o Brasil, participando dos debates para discutir suas produções. |
Terça-feira – 9 DE SETEMBRO:
1º -“OS INVISÍVEIS”
Agromelados Cia de Teatro (Niterói-RJ)
Os invisíveis apresentou um conjunto de
artistas jovens e ainda iniciando no ofício de atuação. O trabalho tem momentos
empolgantes mas precisará de mais ensaios para encontrar uma unidade
coreográfica e uma vocalização mais coesa no seu conjunto.
O figurino, embora não tenha, ainda, uma
unidade estética em si, mostra um grande potencial. Já no quesito cenografia, a
peça surpreende com as caixas de papelão, trabalhadas manualmente que, no
inicio, formam uma espécie de muro, mas que, depois de desmontadas, cada uma
traz um trabalho manual e artístico, como se fosse maquete de interiores, sem
dúvida uma grande sacada do grupo.
2º- “RAYUELA”
Cia Plúmbea (Rio de Janeiro-RJ)
A cena apresentou um ótimo rendimento
corporal, com belas coreografias valorizando a diferença de estatura e volume
corporal entre a atriz e o ator. Mostrou um jogo pulsante que manteve o público
interessado do começo ao fim. O trabalho coreográfico às vezes parecia frio e
ganhava mais vida graças à iluminação criativa e bem executada.
É uma esquete repleta de informações
corporais que às vezes parecia competir com o texto, tornando-o, em alguns
momentos, pouco audível; leve-se em conta o fato de, os atores, por não
conhecerem a "limitação" do teatro, deixaram de investir numa voz
mais eficaz para dar conta do espaço cênico.
3º- “COM CERTEZA”
Coletivo Lá Vai Maria (Rio de Janeiro-RJ)
O grupo apresentou uma boa composição de
cena e distribuiu bem, pelo palco, a presença de músicos ao vivo. A peça foi
apresentada duas vezes e houve uma mudança considerável na iluminação, da
primeira para a segunda apresentação, alterando, de alguma forma, o resultado
final. Há controvérsia se o espetáculo melhorou um não, pois, com os músicos
aparecendo ao fundo, ficava interessante ver a composição dos dois ambientes à
meia luz. Já com os músicos mais escondidos, perdeu-se a interação dos mesmos,
além do que, a luz da cena do primeiro plano também ficou um pouco mais escura.
O ponto alto da cena "Com
Certeza" é a dramaturgia, entrecortada, com diálogos que vão se
completando sempre depois de uma intervenção feita por uma som que vinha da
plateia, isso dava a entender que os personagens eram manipulados pelo autor a
dizer o texto de forma "incompleta"; ideia bem sacada e muito bem
defendida pelo elenco.
4º- “A ARCA DE NOÉ”
Cia Os Bipolares (Cabo Frio/ Cordeiro-RJ )
O trabalho foi divertido, a plateia
curtiu, fica claro que nem sempre, num festival de teatro competitivo o
objetivo é ganhar. A dupla de atores deste trabalho marcaram presença no palco
e ganharam experiência com sua hilariante comédia.
5º- “MATSURI”
Teatro MiMO (Rio de Janeiro-RJ)
Um trabalho diferenciado e raro, mostra
uma dança "Butoh", de origem oriental, misturada com as técnicas
ocidentais de mímica contemporânea. O ator, Tomaz de Aquino, com uma
sensibilidade única, concentrou-se em sua ação no palco e arrebatou a atenção
de uma plateia pouco acostumada com este tipo de linguagem, no entanto, o
público manteve-se concentrado.
Matusuri, apesar de aparentemente
hermético, foi além, mostrando uma fina camada de sensibilidade, valorizando
signos como a pintura das unhas e mãos do ator/bailarino, além da pintura
corporal feita com argila e o uso de talco no cabelo, que, em algum momento,
sacudido, deu uma textura, fazendo um belo contraponto com a iluminação.
Quarta-feira – 10 DE SETEMBRO:
1º - “CENA REAL...É TUDO VERDADE”
Gene Insanno Cia de Teatro (Rio de Janeiro-RJ)
Trabalho provocador e inventivo, manteve
a forma e o estilo sempre polêmico e reflexivo do grupo Gene Insanno, um grupo
que registra um dos maiores níveis de frequência no festival de esquetes de
Cabo Frio.
A ideia de levar pessoas do público para
o palco para torna-los peças de um cenário, foi bem interessante. Destaque
também, para o elenco, treinado, executando falas e situações que, embora
aparentemente improvisadas, exigia fé cênica e convencimento por parte dos
atores, que não decepcionaram.
2º - “SERIAL”
Teatro InVerso (Rio de Janeiro-RJ)
O forte deste trabalho foi a
dramaturgia. Um texto bem escrito com uma respiração que lembra os filmes de
suspense, que nos remete a um belo filme de Hitchcock. No entanto, a
interpretação demasiado contida dos atores fez o trabalho se diluir numa
linguagem muito mais cinematográfica do que, propriamente, teatral.
O uso de cadeiras no palco, entremeadas
por fios que vão formando uma "teia de aranha" deu um toque sutil à
trama embora o trabalho careça de mais carpintaria teatral, aprofundamento na
técnica de atuar e uma forma mais ampla de pesquisa do gênero suspense para
teatro, especificamente.
3º - “TIC TAC”
Cia 6º Ato (Rio de Janeiro-RJ)
Um solo teatral com que utilizou
técnicas de audiovisual, mímica e um cenário que servia de suporte para
projeções, ao mesmo tempo que enquadrava os movimentos e as expressões do ator.
Tudo muito interessante, com grande potencial, no entanto o uso de material
técnico acabou tornando o trabalho um pouco engessado, em função de ajustes
que, muitas vezes, não dão tempo de fazer, quando se trata de um festival de
teatro competitivo.
Sugiro ao ator Junior Vieira que
simplifique sua produção ou treine exaustivamente seus técnicos para criar
possibilidades caso haja imprevistos na hora da montagem. Apesar de alguns
contratempos, o trabalho tem potencial, se bem ensaiado e profundamente
discutido com a equipe responsável por sua realização.
4º - “O POVO, O REI E O BUFÃO DO REI”
Multifoco Cia de Teatro (Rio de Janeiro-RJ)
Trabalho com ótima direção de arte, mostrou
crescimento entre a primeira e a segunda apresentação. Entretanto, o uso
complexo de equipamentos de iluminação gera sempre algum tipo de situação
indesejada que acaba influenciando o desempenho dos atores em cena. Apesar
disso, o grupo está seguro e sabe o que quer. É um trabalho com grande
potencial.
Os efeitos causados pelo uso de um
complexo material de cena, deu ao grupo uma dimensão inventiva e criativa,
saltando do uso de papel colorido, explosões e estalos que contribuíram de
forma diferenciada à narrativa.
5º - “SE A CRIOGENIA FUNCIONASSE”
Grupo Beagle (Rio de Janeiro-RJ)
Atores bem treinados, com um ritmo cênico alucinante,
fizeram um trabalho robusto e detalhista, com boa iluminação e uma grande
empatia junto ao público. O que o grupo apresentou de inovador em seu próprio
processo, foi uma maior teatralidade do texto. Com isso, a vocalização atingiu
o mesmo nível do trabalho corporal.
O trabalho corporal é o ponto forte do grupo
"Beagle". Ultizando técnicas que juntam dança contemporânea,
expressão corporal e mímica teatral, os atores fazem uma alucinada triangulação
que parece tirar o fôlego da plateia. Na minha percepção, o que faltou foi
resolver o excesso de finais. A peça acaba tendo três finais. O primeiro ficou
bom e até funcionou como "falso final", mas depois, parecia não
acabar, talvez, por causa da queda de iluminação em resistência.
Quinta-feira – 11 DE SETEMBRO:
1º - “ESQUETE PARA QUATRO JOGADORES, TRÊS MÁQUINAS DE ESCREVER,
DOIS ESPECTADORES E UM RINOSSORO”
Cia Sem Mim (Rio de Janeiro-RJ)
Muita ironia, tempo cênico típico de
humor nonsense acompanhado de uma boa dose de teatro do absurdo, é um trabalho
que lembra, em quase tudo, o livro "O Processo" de Franz Kafka. A
cena mostrou uma intrigante e criativa trilha musical, com músicos executando
ao vivo "Aquarela do Brasil", de Ari Barroso. Isso deu ao trabalho
uma riqueza ímpar costurada com cenas cheias de humor.
Chamou a atenção o elenco bem afinado e
mergulhado na proposta, embora, algumas falhas de ritmo tenham ficado claras
devido ao fato de o próprio grupo não ter tanta certeza e/ou clareza de sua
proposta. Tirando isso, é um trabalho que tem potencial, se for levado às
últimas consequências.
2º - “MARIA CLÔ”
6 em Cena (Rio de Janeiro-RJ)
O uso de um rádio em cena deu o mote
para uma sonoplastia que alimentou um clima tenso e dramático. A cena tem uma
boa luz, e apresenta uma forma contida de interpretação. O que prejudicou as
atrizes foi a falta de projeção da voz, isso fez com que o público perdesse uma
boa parte do texto. O uso da iluminação, no entanto, criou uma sombra gigante
ao fundo que trouxe plasticidade à cena.
3º - “VIDA DE CÃO”
Grupo Barbudos (Rio de Janeiro-RJ)
Belo texto e ótima interpretação do ator Ricardo Dias,
que construiu a cena com movimentações a partir da plateia. Com uma vocalização
potente, fez o texto chegar até o público com absoluta clareza. Deu para sentir
toda a força da obra do poeta Paulo Leminski.
O trabalho apresenta uma complexidade que necessita mais
pesquisa do ator, talvez um mergulho mais arrojado na relação entre o
personagem central, um mendigo, e sua realidade no palco. Trata-se de um
trabalho com forte potencial.
4º - “ELO”
Grupo Gabriel Bellas e Vanessa Garcia (Niterói-RJ)
Teatro coreográfico e altamente
contemporâneo, teve uma sacada inteligentíssima da dupla de atores que
triangularam no palco de forma criativa e sagaz. Ele, com um potencial
vocal/musical impressionante, e ela com uma ótima expressão corporal e
coreográfica. O trabalho encantou o
público tanto pela beleza da cena e também pela provocação e
criatividade dos artistas envolvidos.
5º - “O COMA”
Grupo Teatral LoucAtores (Rio de Janeiro-RJ)
Direção segura e bem coreografada,
mostrou um elenco com movimentação frenética e ótimas evoluções pelo palco. O
equilíbrio da caixa cênica, a unidade entre figurino e iluminação, fez o
espetáculo parecer "fácil" na mão de um elenco muito bem ensaiado e
compenetrado em cada detalhe exigido na peça.
Embora tivesse um clima de comédia, o
trabalho evitou lugares comuns e apresentou soluções diferenciadas, incluindo a
composição das personagens e a unidade narrativa, formada a partir de um coro
quase perfeito.
Sexta-feira – 12 DE SETEMBRO:
1º - “JOÃO-DE-BARROS”
Grupo de Teatro Mamãe Tá Na Plateia (Belo Horizonte-MG)
O ator Charles Valadares demonstrou
estar bem a vontade com a técnica de mímica contemporânea, divertiu o público
com belas gags gestuais além de impor uma voz bem interessante quando falou
"gromelô"; sua transição para o personagem do imperador foi
impecável, além de demonstrar habilidade no manuseio de materiais de cena.
Faltou adaptar sua cena para o espaço do
teatro, de forma a ficar mais robusta e clara para o público, no entanto, seu
trabalho pode crescer muito ainda.
2º - “FRENESI”
Grupo Café (Maringá-PR)
Uma das peças mais comentadas do Fesq, a
esquete "Frenesi" chamou a atenção pelo seu experimentalismo. O
elenco apresentou uma construção fluida através do silêncio, evitando cair na
mímica. Conseguiu imprimir um ritmo de teatro experimental e absurdo, com
pouquíssimo texto e muita ação dramática e física. Destaque para a direção que
soube distribuir bem as atrizes pelo palco e fazer um jogo que permitiu
diversas leituras por parte do público.
A sugestão é que o grupo seja mais
cuidados em relação à finalização da cena. As atrizes estão concentradas mas o
final abrupto provoca uma sensação de que o espetáculo termina na hora errada.
É bom o elenco ficar atento a isso e aumentar mais um pouco o tempo da queda de
luz em resistência, esperar a recomposição do elenco para saudar o público ao final.
3º - “SESSÃO MATINÊ”
Grupo Matinê (Rio de Janeiro-RJ)
Texto divertido e muito criativo, não há
dúvida que a dramaturgia é um dos pontos mais fortes deste trabalho. Os atores,
tiveram um bom desempenho e souberam fazer um jogo gostoso que resultou numa
comédia elegante e com bom ritmo.
Faltou projetar mais a voz, para que o
público pudesse sentir melhor a energia dos atores em cena.
4º - “ENQUANTO ESPERAMOS (E ELES NÃO SAEM DO LUGAR)”
Concreta Cia de Teatro (Belo Horizonte-MG)
Dois atores habilidosos e com grande
potencial. Precisam melhorar o desempenho vocal e tirar o excesso de
movimentação, entender o tempo dramático da obra de Samuel Beckett, para
concatenar o imenso repertório de técnicas que possuem.
5º - “SOLO ALMODÓVAR”
Saltoalto Investigações Cênicas (Salvador-BA)
A Atriz Simone Brault deu um show de
profissionalismo, demonstrou um alto nível de relação com o ofício de atuar. Soube
exprimir várias técnicas durante sua performance:. Voz bem colocada, ótima caracterização, figurino
e maquiagem impecáveis, além de desenvoltura e firmeza na movimentação pelo
palco.
Foi aplaudida em pé e agradou tanto o
público como o júri. Seu trabalho cresceu da primeira para a segunda
apresentação. Destaque para o momento em que ela canta. A finalização da cena é
precisa e sua esquete finaliza no momento certo.
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